quinta-feira, setembro 06, 2007

Irmã contra irmãUma zanga familiar divide hoje o país ao meio.As protagonistas são as irmãs Salgado – Ana Maria e Carolina, por sinal irmãs gémeas.A segunda foi quem primeiro se celebrizou, depois de se ter tornado companheira de Pinto da Costa, com quem viveu seis anos, antes de se separar dele e publicar um livro onde não o poupa.A segunda saiu do anonimato por ser irmã gémea da primeira – mas, sobretudo, por ter prestado declarações à Justiça que põem em causa o que Carolina disse e escreveu.E é isso que verdadeiramente nos interessa.Após a escolha de Maria José Morgado para coordenar o processo Apito Dourado, a magistrada entrou em contacto com Carolina Salgado, convencendo-a a colaborar activamente com a Justiça nas acusações contra Pinto da Costa.Carolina veio então a Lisboa e disponibilizou-se para tudo o que fosse necessário: falou, falou, contou à magistrada tudo o que sabia e provavelmente também o que não sabia.As suas declarações foram reproduzidas com destaque e encheram páginas de jornais.É nesta altura que entra em cena a irmã gémea.Prestando declarações no Porto, Ana Maria põe em causa o depoimento de Carolina e garante que houve cumplicidades suspeitas entre ela e elementos da equipa de Morgado.Jura que a própria Maria José telefonava amiúde à irmã, que os investigadores sugeriam a Carolina o que havia de dizer, que o seu depoimento, por isso, não tem autenticidade e não merece credibilidade.As posições extremam-se e dividem os magistrados. O Ministério Público do Porto, sentindo-se ultrapassado por Maria José Morgado e não apreciando o seu protagonismo, apoia Ana Maria contra a equipa de investigação de Lisboa.Maria José Morgado, por seu lado, reforça a sua confiança em Carolina e decide pôr um processo contra a irmã.E surgem outros protagonistas. Como o presidente do FC Porto, Pinto da Costa, que é o principal interessado no caso e arrasta consigo vários dirigentes do futebol nortenho.Ou como o presidente do SL Benfica, Luís Filipe Vieira, e vários jornalistas afectos ao clube, que são apontados como ‘colaboradores’ de Carolina (que assim se vê acusada de, após ter traído o companheiro, trair o seu próprio clube, prestando um serviço ao rival Benfica).Temos, assim, montada uma nova guerra Porto-Lisboa.Claro que não são as gémeas Salgado as culpadas.A disputa entre elas só funcionou como catalisador, como polarizador de tensões latentes que existem no país e só esperam um pretexto para se manifestar.Por isso, esta guerra de irmãs ilustra uma face de Portugal. Um lado intriguista, alcoviteiro, invejoso, vingativo, que o país nunca deixou de ter.Não me peçam que diga, aqui, quem tem razão. Mas uma coisa já é certa: a equipa de Maria José Morgado, a mulher que queria pôr ordem na Justiça portuguesa, a magistrada em que se depositavam todas as esperanças, uma espécie de ‘santa da Ladeira’ da magistratura nacional, vai sair beliscada desta guerra.É que a procissão ainda vai no adro e isto já não é a brincar.Mete magistrados de um lado e do outro, magistrados do Porto e magistrados de Lisboa, que se sentem feridos no seu brio profissional e querem impor a sua verdade.Mete o orgulho do Norte e a sobranceria do Sul.Mete a paixão clubística, com os adeptos dos dois maiores clubes portugueses, o Porto e o Benfica, a guerrearem em barricadas opostas.Mete ainda corrupção, favores e prostituição.Numa palavra, mete todos os ingredientes para um cocktail explosivo.Até uma zanga entre duas irmãs gémeas.P.S. – Esta semana morreram Bergman e Antonioni. São dois heróis da minha adolescência. O primeiro esmagou-me com os seus filmes, gelados como as planícies nórdicas, que eu percebia com dificuldade mas admirava. O segundo foi sobre quem escrevi o primeiro artigo que publiquei num jornal. Adorei-o como a um deus. Vi A Noite, A Aventura ou O Deserto Vermelho com sentimentos tão intensos como se vivesse uma paixão.