A CULTURA DO FUTEBOL
A Europa do futebol vive um momento de grande transformação, espelho das convulsões sociais, políticas e territoriais que abalaram a sua estrutura durante a última década. Com o passar do século, as fronteiras, muitas delas criadas pelas conjunturas de cada época, foram-se esbatendo e hoje caminhámos na direcção de um mercado cada vez mais aberto, numa União Europeia que se estendeu, recentemente, para lá das Balcãs, e abraçou também países outrora alinhados atrás do pacto de Varsóvia, expressão de, digamos, outra Europa. São novos tempos.
No plano futebolístico, A UEFA também começou a ser surpreendida, a partir de meados dos anos 90, com esta nova realidade, despoletada nas suas quatro-linhas, por um até então completamente desconhecido jogador belga da III Divisão, Jean Marc Bosman. No fundo, tratou-se apenas de confirmar que, no futebol, como noutros pontos de actividade, os grandes motores de mudança são os interesses económicos e as leis que deles emanam friamente.. Pouco parece hoje importar aos tecnocratas de Bruxelas aquele pequeno pormenor da maioria dos povos do Velho Continente terem no seu passado séculos de história nos quais construíram uma identidade própria. Assim, com o seu chamado acordão-Bosman, de 1995, criou-se uma nova ordem futebolística dentro da Europa da livre circulação de pessoas e bens. Em nome de uma Europa comunitária unida pelo dinheiro e pelos macrocéfalos interesses económicos de uma minoria de gigantes, desenharam-se novas fronteiras, nova moeda, novas nações independentes, novos ciclos migratórios, e, um novo futebol também. No relvado e fora dele. Por entre todas esta atmosfera de intriga político-financeira, ainda vai, no entanto, também sendo possível falar da abordagem do jogo propriamente dentro dito.
O Kalinka nas ruas de Londres...
Os ventos soprados dos gabinetes dos tecnocratas, nos últimos anos, influenciaram , no entanto, talvez em demasia, a pura envolvência desportiva das quatro linhas, colocando em xeque referências culturas a nível de estilos de jogo e diferentes escolas de futebol criadas ao longo de um século de confrontos dentro de um mágicozinho rectângulo verde com duas balizas e uma bola.
Vive-se um período em que se teme a adulteração dos tradicionais estilos de futebol. Algo que já aconteceu, em muitos pontos do continente, a nível de clubes, com o fim de limite á utilização de comunitários, ao ponto de hoje já ser claramente uma força de expressão falar-mos, por exemplo, do Chelsea ou do Arsenal como equipas genuinamente inglesa, pois poucos jogadores ingleses, ou até britânicos, actuam no seu onze, para além, claro, de outras situações satélites, que não são para aqui chamadas, como a de um mítico clube secular de Londres passar a ser, num ápice, propriedade de um milionário vindo da soturna oligarquia russa e pouca gente parece incomodar-se muito com isso. Antes de entrar em campo, no local de culto onde antes foram criados os acordes underground dos Pixies e dos Clash, o onze multinacional do Chelsea entra agora em campo ao som do Kalinka. Tenebrosos sinais dos tempos. Resultado da força do dinheiro, sinistros vendedores de sonhos, lobos em pele de cordeiro, apesar de no horizonte continuarem a pairar densas nuvens negras.
A Europa do Futebol-Arte
Mas, falemos do chamado futebol em estado puro. O jogado dentro das quatro linha, onde, apesar das loucas tentativas vindas por exemplo do Qatar ou de algumas naturalizações intrigantes (como a de ver um nigeriano jogar como ponta de lança da selecção polaca), as selecções ainda continuam a ser o derradeiro refúgio para se poder observar, em campo, os diferentes estilos de futebol que povoam o velho continente. Este ensaio é, assim, como que um mergulhar na história das diferentes grandes escolas do futebol europeu, o que as destingue e o que as une, sua evolução e transformações cíclicas, suas particularidades e traços essenciais de identidade própria. É, apenas, um exercício de reflexão, uma tentativa de devolver o futebol ao... futebol. Não pretende ser uma lição de história.
Corria o ano de 1987, quando o jornal “Líberátion” colocou frente a frente, em diálogo, dois supremos artistas gauleses de diferentes galáxias: Michel Platini e Marguerite Duras. Futebol e literatura. O músculo e o intelecto.
- “Nós somos um pouco o único assunto francês que se fala, de resto, fala-se dos perfumes...”, dizia o futebolista.
- “E da literatura...”, corrige a dama escriba.
- “Sim mas se falar com os meninos pobres da Malásia ou da América latina eles não falam de livros. Infelizmente...”, responde Platini.
- “Eu sou traduzida em 30 países. Ora, isso é mais do que a Europa e a América”, corrige Duras.
- “Sim, mas se for ás favelas do Rio não penso que a literatura seja muito importante. Pelo contrário, o futebol é a única forma deles expressarem a sua arte e cultura.”, sentencia o Astérix da bola.
Embora parecendo presos em dois diferentes mundos, Duras e Platini são personagens do mesmo habitat. O Planeta da arte. No momento em que se encontraram, a saga do antes anónimo jogador belga, Jean Marque Bosman, então condenado a uma carreira discreta em clubes francófonos de segundo plano, ainda era algo de impensável.
Percorrendo os relvados do Velho Continente, como um mendigo de chapéu estendido suplicando por um pedaçito de bom futebol, como diria Eduardo Galeano, continuam a descobrir-se, no entanto, apesar das confusões estilísticas do presente, jogadores capazes de nos tirar a respiração: Zidane, um jogador de playsation nos movimentos que quase o fazem parecer em campo, pela elegância coordenada de movimentos, um desenho de computador, Raúl, um chico que incorpora a fúria espanhola temperada com a técnica feita carácter, um toureiro da bola de rasgos individuais alucinantes, ou, entre outros, Thierry Henry, mais rápido do que a sua própria sombra, um velocista que transforma a bola que nos seus pés parece como uma lebre que vai desbravando caminho furando através da floresta de adversários ruma á sua toca e refúgio, a baliza. Todos estes magos brilham, porém, com luz própria, para lá dos sistemas tácticos, de quem chegam a rir-se, e, até, dos tradicionais estilos de futebol de cada país. São, digamos, jogadores “do mundo”, nasceram assim, souberam entender como poucos a relação entre o homem e a bola, e, hoje, quase são extra-terrestres num futebol que se alimenta dos mitos do passado e glorifica as personagens duras do presente.
A adulteração dos velhos estilos
A evolução cruzada da união política europeia com o mundo do futebol levou ao fim de uma estrutura desportiva com mais de 50 anos. Meia década depois da sua explosão, a Lei Bosman continua a reger os destinos da Europa da bola, confusa perante a adulteração das suas diferentes “identidades futebolísticas”. Neste contexto, ainda faz hoje sentido falar das diferentes grandes escolas do futebol europeu nos mesmos termos em que as fomos entendendo ao longo dos tempos? E com o fim das fronteiras e a livre circulação de pessoas e bens, que levou a um movimento de transferências multinacional nunca visto no mundo do futebol europeu, será possível cada escola de futebol manter a sua genuína identidade?
Visitemos a história: Na Inglaterra, cultiva-se o chamado “jogo directo”, adepto das bolas em profundidade e do espirito lutador que cansa só de ver; Na Alemanha, nasceu e cresceu, com glória e hosanas o império do futebol força, um estilo de nariz no ar e botas cardadas que feito de músculos e caras feias assustou velhos e crianças. Na Holanda, nasceu uma superior filosofia de jogo, o Futebol-total, afinal o ovo de Colombo do bom futebol baseado na inteligente posse da bola e sua circulação por todo o campo, girando os jogadores como num carrossel mágico sem posições fixas. Em Itália, berço da latinidade e sua maior expressão de força, enraizou-se o dogma do futebol tacticista, mentor das mais mórbidas sistemas defensivos por entre um clima dramático que, ciclicamente ao longos das épocas, remeteu muitas vezes para o banco os individualistas tacticamente subversivos.
Tudo isto são diferentes formas de entender o futebol e abordar o jogo. Questão culturais, desportivas ou, até meras opções de estilo e decoração de interiores, nos quais uns tem mais dilemas estéticos do que outros. Nunca ninguém, por exemplo, viu um Alemão muito preocupado com a beleza do seu monocórdico futebol musculado. Ao invés, vemos os latinos, onde a arte tem outro entendimento, presos desde há décadas e décadas, á ideia de que só existe nobreza numa vitória alcançada através de uma exibição com traços de beleza, corolário da chamada superioridade moral futebolística
Diferentes escolas, diferentes comunidades de cultura
Deve-se dizer, porém, que nada há de negativo em diferentes treinadores ou até jogadores, com as suas ideias e concepções, influenciarem o estilo ou a mentalidade de outro país para onde emigraram. Muita da evolução do futebol mundial passou exactamente por essa facto. Basta ver o futebol norte europeu como uma derivação do estilo britânico, ou, noutro prisma, a extensão á América do sul de muitos conceitos das nações latinas europeias, num cruzamento de influências que teve alternados cursos migratórios. A questão que preocupa as consciências europeias mais puristas ou devotas da tradição reside, porém, na dificuldade que perante este cenário de globalização, seja possível, em ultima instância, até as próprias selecções manterem as suas diferentes identidades futebolísticas, ameaçadas nos últimos tempos por algumas duplas nacionalidades de contorno duvidoso que confundiram muitos espíritos dentro do status do futebol europeu.
Neste sentido, as selecções nacionais, a bandeira e o hino, devem ser, antes do mais, entendidas como uma comunidade de culturas e emoções. É, por isso, que é perfeitamente natural um português se sentir, cultural e emocionalmente, hoje muito mais próximo de um angolano ou de um moçambicano do que de um sueco ou de um alemão. São séculos de história que repousam nas nossas costas, e, por mais que se tente, não se pode apagar todas esse legado com um simples texto escrito num papel timbrado no conforto de um qualquer gabinete com ar condicionado situado num luxuoso edifico de Bruxelas.
Falemos, pois, de futebol, distinguindo, historicamente, cinco grandes escolas de futebol europeu: A latina (Itália, França Espanha e Portugal), a anglo-saxónica (Inglaterra e Alemanha), a holandesa, quase um futebol de autor entalado entre o sul e o norte do Velho continente, a Norte europeia (Suécia e Dinamarca) e a de leste (Rússia, Republica Checa e Búlgária), onde também se pode integrar, rebelde e em busca de novas referências sólidas a velha escola jugoslava, hoje desmembrada em vários nações e que terá, no Euro-2004, como legitimo representante a insubmissa selecção da Croácia....
A Europa do futebol vive um momento de grande transformação, espelho das convulsões sociais, políticas e territoriais que abalaram a sua estrutura durante a última década. Com o passar do século, as fronteiras, muitas delas criadas pelas conjunturas de cada época, foram-se esbatendo e hoje caminhámos na direcção de um mercado cada vez mais aberto, numa União Europeia que se estendeu, recentemente, para lá das Balcãs, e abraçou também países outrora alinhados atrás do pacto de Varsóvia, expressão de, digamos, outra Europa. São novos tempos.
No plano futebolístico, A UEFA também começou a ser surpreendida, a partir de meados dos anos 90, com esta nova realidade, despoletada nas suas quatro-linhas, por um até então completamente desconhecido jogador belga da III Divisão, Jean Marc Bosman. No fundo, tratou-se apenas de confirmar que, no futebol, como noutros pontos de actividade, os grandes motores de mudança são os interesses económicos e as leis que deles emanam friamente.. Pouco parece hoje importar aos tecnocratas de Bruxelas aquele pequeno pormenor da maioria dos povos do Velho Continente terem no seu passado séculos de história nos quais construíram uma identidade própria. Assim, com o seu chamado acordão-Bosman, de 1995, criou-se uma nova ordem futebolística dentro da Europa da livre circulação de pessoas e bens. Em nome de uma Europa comunitária unida pelo dinheiro e pelos macrocéfalos interesses económicos de uma minoria de gigantes, desenharam-se novas fronteiras, nova moeda, novas nações independentes, novos ciclos migratórios, e, um novo futebol também. No relvado e fora dele. Por entre todas esta atmosfera de intriga político-financeira, ainda vai, no entanto, também sendo possível falar da abordagem do jogo propriamente dentro dito.
O Kalinka nas ruas de Londres...
Os ventos soprados dos gabinetes dos tecnocratas, nos últimos anos, influenciaram , no entanto, talvez em demasia, a pura envolvência desportiva das quatro linhas, colocando em xeque referências culturas a nível de estilos de jogo e diferentes escolas de futebol criadas ao longo de um século de confrontos dentro de um mágicozinho rectângulo verde com duas balizas e uma bola.
Vive-se um período em que se teme a adulteração dos tradicionais estilos de futebol. Algo que já aconteceu, em muitos pontos do continente, a nível de clubes, com o fim de limite á utilização de comunitários, ao ponto de hoje já ser claramente uma força de expressão falar-mos, por exemplo, do Chelsea ou do Arsenal como equipas genuinamente inglesa, pois poucos jogadores ingleses, ou até britânicos, actuam no seu onze, para além, claro, de outras situações satélites, que não são para aqui chamadas, como a de um mítico clube secular de Londres passar a ser, num ápice, propriedade de um milionário vindo da soturna oligarquia russa e pouca gente parece incomodar-se muito com isso. Antes de entrar em campo, no local de culto onde antes foram criados os acordes underground dos Pixies e dos Clash, o onze multinacional do Chelsea entra agora em campo ao som do Kalinka. Tenebrosos sinais dos tempos. Resultado da força do dinheiro, sinistros vendedores de sonhos, lobos em pele de cordeiro, apesar de no horizonte continuarem a pairar densas nuvens negras.
A Europa do Futebol-Arte
Mas, falemos do chamado futebol em estado puro. O jogado dentro das quatro linha, onde, apesar das loucas tentativas vindas por exemplo do Qatar ou de algumas naturalizações intrigantes (como a de ver um nigeriano jogar como ponta de lança da selecção polaca), as selecções ainda continuam a ser o derradeiro refúgio para se poder observar, em campo, os diferentes estilos de futebol que povoam o velho continente. Este ensaio é, assim, como que um mergulhar na história das diferentes grandes escolas do futebol europeu, o que as destingue e o que as une, sua evolução e transformações cíclicas, suas particularidades e traços essenciais de identidade própria. É, apenas, um exercício de reflexão, uma tentativa de devolver o futebol ao... futebol. Não pretende ser uma lição de história.
Corria o ano de 1987, quando o jornal “Líberátion” colocou frente a frente, em diálogo, dois supremos artistas gauleses de diferentes galáxias: Michel Platini e Marguerite Duras. Futebol e literatura. O músculo e o intelecto.
- “Nós somos um pouco o único assunto francês que se fala, de resto, fala-se dos perfumes...”, dizia o futebolista.
- “E da literatura...”, corrige a dama escriba.
- “Sim mas se falar com os meninos pobres da Malásia ou da América latina eles não falam de livros. Infelizmente...”, responde Platini.
- “Eu sou traduzida em 30 países. Ora, isso é mais do que a Europa e a América”, corrige Duras.
- “Sim, mas se for ás favelas do Rio não penso que a literatura seja muito importante. Pelo contrário, o futebol é a única forma deles expressarem a sua arte e cultura.”, sentencia o Astérix da bola.
Embora parecendo presos em dois diferentes mundos, Duras e Platini são personagens do mesmo habitat. O Planeta da arte. No momento em que se encontraram, a saga do antes anónimo jogador belga, Jean Marque Bosman, então condenado a uma carreira discreta em clubes francófonos de segundo plano, ainda era algo de impensável.
Percorrendo os relvados do Velho Continente, como um mendigo de chapéu estendido suplicando por um pedaçito de bom futebol, como diria Eduardo Galeano, continuam a descobrir-se, no entanto, apesar das confusões estilísticas do presente, jogadores capazes de nos tirar a respiração: Zidane, um jogador de playsation nos movimentos que quase o fazem parecer em campo, pela elegância coordenada de movimentos, um desenho de computador, Raúl, um chico que incorpora a fúria espanhola temperada com a técnica feita carácter, um toureiro da bola de rasgos individuais alucinantes, ou, entre outros, Thierry Henry, mais rápido do que a sua própria sombra, um velocista que transforma a bola que nos seus pés parece como uma lebre que vai desbravando caminho furando através da floresta de adversários ruma á sua toca e refúgio, a baliza. Todos estes magos brilham, porém, com luz própria, para lá dos sistemas tácticos, de quem chegam a rir-se, e, até, dos tradicionais estilos de futebol de cada país. São, digamos, jogadores “do mundo”, nasceram assim, souberam entender como poucos a relação entre o homem e a bola, e, hoje, quase são extra-terrestres num futebol que se alimenta dos mitos do passado e glorifica as personagens duras do presente.
A adulteração dos velhos estilos
A evolução cruzada da união política europeia com o mundo do futebol levou ao fim de uma estrutura desportiva com mais de 50 anos. Meia década depois da sua explosão, a Lei Bosman continua a reger os destinos da Europa da bola, confusa perante a adulteração das suas diferentes “identidades futebolísticas”. Neste contexto, ainda faz hoje sentido falar das diferentes grandes escolas do futebol europeu nos mesmos termos em que as fomos entendendo ao longo dos tempos? E com o fim das fronteiras e a livre circulação de pessoas e bens, que levou a um movimento de transferências multinacional nunca visto no mundo do futebol europeu, será possível cada escola de futebol manter a sua genuína identidade?
Visitemos a história: Na Inglaterra, cultiva-se o chamado “jogo directo”, adepto das bolas em profundidade e do espirito lutador que cansa só de ver; Na Alemanha, nasceu e cresceu, com glória e hosanas o império do futebol força, um estilo de nariz no ar e botas cardadas que feito de músculos e caras feias assustou velhos e crianças. Na Holanda, nasceu uma superior filosofia de jogo, o Futebol-total, afinal o ovo de Colombo do bom futebol baseado na inteligente posse da bola e sua circulação por todo o campo, girando os jogadores como num carrossel mágico sem posições fixas. Em Itália, berço da latinidade e sua maior expressão de força, enraizou-se o dogma do futebol tacticista, mentor das mais mórbidas sistemas defensivos por entre um clima dramático que, ciclicamente ao longos das épocas, remeteu muitas vezes para o banco os individualistas tacticamente subversivos.
Tudo isto são diferentes formas de entender o futebol e abordar o jogo. Questão culturais, desportivas ou, até meras opções de estilo e decoração de interiores, nos quais uns tem mais dilemas estéticos do que outros. Nunca ninguém, por exemplo, viu um Alemão muito preocupado com a beleza do seu monocórdico futebol musculado. Ao invés, vemos os latinos, onde a arte tem outro entendimento, presos desde há décadas e décadas, á ideia de que só existe nobreza numa vitória alcançada através de uma exibição com traços de beleza, corolário da chamada superioridade moral futebolística
Diferentes escolas, diferentes comunidades de cultura
Deve-se dizer, porém, que nada há de negativo em diferentes treinadores ou até jogadores, com as suas ideias e concepções, influenciarem o estilo ou a mentalidade de outro país para onde emigraram. Muita da evolução do futebol mundial passou exactamente por essa facto. Basta ver o futebol norte europeu como uma derivação do estilo britânico, ou, noutro prisma, a extensão á América do sul de muitos conceitos das nações latinas europeias, num cruzamento de influências que teve alternados cursos migratórios. A questão que preocupa as consciências europeias mais puristas ou devotas da tradição reside, porém, na dificuldade que perante este cenário de globalização, seja possível, em ultima instância, até as próprias selecções manterem as suas diferentes identidades futebolísticas, ameaçadas nos últimos tempos por algumas duplas nacionalidades de contorno duvidoso que confundiram muitos espíritos dentro do status do futebol europeu.
Neste sentido, as selecções nacionais, a bandeira e o hino, devem ser, antes do mais, entendidas como uma comunidade de culturas e emoções. É, por isso, que é perfeitamente natural um português se sentir, cultural e emocionalmente, hoje muito mais próximo de um angolano ou de um moçambicano do que de um sueco ou de um alemão. São séculos de história que repousam nas nossas costas, e, por mais que se tente, não se pode apagar todas esse legado com um simples texto escrito num papel timbrado no conforto de um qualquer gabinete com ar condicionado situado num luxuoso edifico de Bruxelas.
Falemos, pois, de futebol, distinguindo, historicamente, cinco grandes escolas de futebol europeu: A latina (Itália, França Espanha e Portugal), a anglo-saxónica (Inglaterra e Alemanha), a holandesa, quase um futebol de autor entalado entre o sul e o norte do Velho continente, a Norte europeia (Suécia e Dinamarca) e a de leste (Rússia, Republica Checa e Búlgária), onde também se pode integrar, rebelde e em busca de novas referências sólidas a velha escola jugoslava, hoje desmembrada em vários nações e que terá, no Euro-2004, como legitimo representante a insubmissa selecção da Croácia....
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